18 de agosto de 2010

Para Apreciar a Arte - Roteiro Didático


Este é o nome do livro de Antonio F. Costella, artista, escritor e professor, onde ele propõe um roteiro básico para o leitor apreciar de forma plena uma obra de arte. De acordo com o autor, uma análise do conteúdo da obra de arte não pode deixar de considerar dez importantes pontos de vista:


1. O Ponto de Vista Factual


A apreensão do conteúdo factual se concretiza simples e tão somente pela identificação, em nível meramente descritivo, dos elementos que compõem a obra.

Quando muitas vezes, o que se vê na obra pode não ser facilmente identificado pelo observador que não possui familiaridade com o período na qual o obra foi executada, é necessário recorrer a informações externas à obra. E essa compreensão de todo o conteúdo factual da obra favorecerá uma melhor compreensão da obra.

" Do mesmo modo que a Arte sempre ensinou História aos homens, de sua parte a História também nos auxilia a compreender a Arte" (pg. 20).

No caso de obras não figurativas, o conteúdo factual refere-se aos elementos constitutivos do quadro, ou seja, tudo o que pode ser descrito como as formas e cores.


2. O Ponto de Vista Expressional


Esse conteúdo, ao contrário do que possa parecer, é atributo da obra, e não do observador, pois as reações do observador não são fruto do acaso. A escolha do tema, das cores, os traços, as linhas e formas, a composição, tudo é pensado e elegido de forma a transmitir exatamente o sentimento proposto pelo artista. Ou seja, ele induz no observador um determinado sentimento que é habilmente desencadeado.

Portanto o conteúdo expressivo da obra é absorvido pelo espectador, quando somos tomados por algum tipo de sentimento ao observarmos um quadro. Podemos dizer que esse conteúdo foi compreendido quando analisamos o tipo de sentimento que nos provocou e podemos explicar suas causas, o que exatamente foi feito para criar esse efeito.


3. O Ponto de Vista Técnico


A apreciação da obra de arte refere-se à a competência do artista e as qualidades do material. Diz respeito aos elementos materiais e imateriais. Enfim, o material utilizado para executar a obra somado ao conhecimento teórico.

Este ponto de vista já exige certo conhecimento prévio por parte do observador, o que não ocorre com os pontos de vista anteriormente analisados. Exemplos: Além da técnica aplicada na execução, uma pessoa mais


4. Ponto de Vista Convencional


Com as devidas informações iconográficas, a fruição da obra de arte se intensifica.

Os objetos quando exteriorizam aquilo que são e para que servem nos permitem uma identificação direta, mas também podem representar ago além, assumindo o caráter evocativo de alguma coisa neles identificada de maneira indireta. Quando os objetos deixam de ser apenas aquilo que são e passam a sugerir também alguma outra coisa, eles se tornam símbolos.

O conteúdo factual da obra já mencionado anteriormente diz respeito a essa identificação direta, já o conteúdo convencional da obra interessa-se por eles como símbolos.

Para isso, é necessário obter informações sobre o universo cultural em que a obra foi realizada.


5. Ponto de Vista Estilístico


A adaptação de um mesmo tema de acordo ao seu tempo, e ou ao seu lugar, cria um estilo desse momento cultural. Porém a análise desse ponto de vista não se detém na identificação da corrente artística à qual a obra pertence. Pois além desse conteúdo estilístico coletivo, devemos considerar também o conteúdo estilítico individual, resultante da personalidade do artista criador. Mas devemos lembrar que a manifestação de um estilo individual foi suprimido em várias antigas civilizações como a egípcias, bizantina, além de outras civilizações teocráticas onde as obras deviam ser executadas seguindo rígidos padrões e regras. Somente passou a ser fortemente apreciado depois do renascimento.

Somente o aprofundamento no estudo da história da arte nos fornecerá o conhecimento sobre as diversas correntes artísticas e também informações bibliográficas que nos informará sobre a contribuição de cada artista em especial.


6. O Ponto de Vista Atualizado


Este ítem diz respeito à contribuição do observador neste processo de apreciação da obra. pois a fruição artística pressupõe sempre, além da obra em si, a presença de um observador.

A atualização decorre do deslocamento no tempo ou de lugar da obra de arte, pois esta é percebida diferentemente por um novo observador que pertencerá a um outro universo cultural. Dessa forma a noção da existência desse contéudo atualizado da obra nos permite compreender o porquê do valor artístico das obras variarem no tempo e no espaço.

Cabe ressaltar que quando analisamos as obras sobre o ponto de vista atualizado estamos trazendo-as para a nossa optica cultural, e a atualização costuma ser generalizada e coerente, ou seja, tende a ser feita igual por todos de um mesmo ambiente cultural.


7. O Ponto de Vista Institucional


As instituições em geral como os museus, as universidades e veículos de comunicação, hierarquizam as obras de arte atribuindo a elas o que o autor chama de valor institucional. A análise da obra por meio desse ponto de vista pode ser uma forma de atualização da obra, porém observamos algumas diferenças, pois a visão institucional possui um caráter mais formal que a atualização, que se forma por meio de estímulos sociais espontâneos.

No caso da visão institucional incidir sobre uma obra contemporânea em nosso próprio meio cultural, a atualização não irá ocorrer, mas muitas vezes as atualizações ocorrem inclusive a partir de elementos institucionais.


8. Ponto de Vista Comercial


Não podemos nos esquecer da importância do mercado no mundo das artes, ou seja, na valor que as obras adquirem nas mãos de "conhecedores", valor esse totalmente relativo e que gera discussões em vários níveis.

Esse ponto de vista pode estar fortemente relacionado com o ponto de vista institucional, visto que a fama de um artista ou o seu apreço institucional, pode elevar consideravelmente sua cotação no mercado das artes.

As obras de arte sempre tiveram um valor comercial, mas a tendência instaurada durante o Renascimento, intensificada pela Revolução Industrial e o avanço das comunicações, fez com que ela se valorizasse como nunca antes visto.


9. Ponto de Vista Neofactual


O ponto de vista neofactual leva em conta o conteúdo acrescido à obra com o passar dos anos, algo que pode não ter nem mesmo sido previsto pelo artista. Ex: O escurecimento da pintura em virtude do envelhecimento do verniz empregado na tela.

Diferentemente do ponto de vista atualizado, a alteração que ocorre na obra é real e não mental, devemos sempre nos lembrar de que a obra de arte está sempre sujeita a transformações físicas. A simples reprodução para o vídeo de uma peça de teatro é uma modificação do original, as cores do figurino podem não ser representadas fidedigname. Outro exemplo bem significativo são as traduções de obras literárias.

Porém, esse conteúdo neofactual nem sempre é um prejuízo, pois ao mesmo tempo em que a obra original deixa de existir de forma plena, poderá surgir algo novo a partir dela, e talvez tão belo quanto e em alguns casos ainda melhores.


10. Ponto de Vista Estético


Para começar, o valor estético da obra é algo distinto de seu valor expressional que apenas toca ou desperta nossos sentimentos comuns, pois uma obra com forte valor artístico vai além; extasia, enleva e enobrece nosso espírito.

Segundo Harold Osborne, " a experiência estética é um modo de cognição através da apreensão direta (...) é uma ampliação e uma intensificação da percepção sensorial" (A Apreciação da arte, São Paulo, Cultrix, 1978, p. 206). É uma forma de conhecimento através dos sentidos, mas que opera antes de atingir à razão.

Além disso, uma obra de arte de grande valor consegue sustentar longamente o interesse do observador que após absorver o conteúdo estético, parte para a reflexão desse conteúdo que pode ainda gerar novas apreensões num ir e vir constante e interminável.

Dessa forma, a capacidade de apreensão do conteúdo estético é aguçada principalmente através da contemplação reiterada, não necessariamente da mesma obra.


14 de novembro de 2009

Trabalho Descrição V

Exposição: Henri Cartier-Bresson: Fotógrafo

Local: Sesc Pinheiros - São Paulo




Obra analisada: Istambul, 1964. Acervo da Agência Magnum.

Artista: Henri Cartier-Bresson


Uma banal cena urbana: pessoas descendo uma escadaria, é transformada em uma ótima foto! Este é um exemplo de como a genialidade e aguçada percepção de um artista transforma uma paisagem nada especial em uma belíssima e primorosa composição. Explorou-se a sinuosidade da escadaria. A fotografia tirada de um ângulo na diagonal, valoriza as curvas por quebrar a monotonia das proporções que seriam registradas caso a foto fosse tirada de frente. Além disso, criou-se uma harmonia geométrica com duas linhas paralelas no centro. O corrimão das escadarias à esquerda e à direita formam um ziguezague, cujo efeito é ainda enfatizado e equilibrado com o posicionamento das quatro pessoas que também formam um ziguezague quando mentalmente interligadas. Certamente esta cena-paisagem passaria desapercebida por qualquer um de nós!


Trabalho Descrição IV

Exposição: Matisse Hoje

Local: Pinacoteca do Estado de São Paulo




Obra analisada: Odalisca com calça vermelha, 1921. Óleo sobre tela. Museu Nacional de Arte Moderna, Centre Pompidou.

Artista: Henri Matisse


A figura principal, uma mulher semi-nua deitada sobre um acolchoado, atravessa o quadro criando uma diagonal do canto inferior esquerdo para o superior direito. Nessa análise de uma primeira divisão do quadro, há praticamente um equilíbrio entres as partes divididas. Já numa segunda suposta bipartição do quadro, atravessando-o com uma linha horizontal que passaria bem ao meio, na altura do umbigo da personagem, podemos verificar um destacado contraste entre as duas metades. Na parte superior, a delicadeza da pose e do olhar da mulher está em harmonia com o fundo da parede decorado em tons frios criando uma atmosfera serena. E na parte inferior, há um predomínio de cores quentes, principalmente do vermelho vivo que cobre todo o chão e que é também a cor da calça em estilo oriental que veste a figura feminina. A escolha desse mesmo vermelho tanto para representar a calça quanto o chão dilui o efeito chamativo que o vermelho criaria se estivesse somente na calça, ao mesmo tempo em que possibilita que este detalhe não deixe de ser importante. Além disso, esse contraste das cores realça a leveza da cena na parte superior.


Trabalho Descrição III

Exposição: O Cubismo e seus entornos nas coleções da Telefônica.

Local: Pinacoteca do Estado de São Paulo.




Obra analisada: A roupa, 1912. Óleo sobre tela, 99 x 75 cm.

Artista: Natalia Gontcharova


Extremamente vigorosa na apresentação do seu conjunto de elementos, esta obra é considerada cubista mas também possui elementos futuristas, outra forte influência desta artista. O círculo, peça de um maquinário, presente próximo ao canto inferior esquerdo do quadro representa a exaltação do desenvolvimento tecnológico. Outro elemento de destaque é uma granada explosiva, no canto superior também à esquerda, que pode sugerir uma certa glorificação da guerra já que essa figura é colocada harmoniosamente junto às demais, e até mesmo um ornamento singelo é posto abaixo dela para disfarçar uma certa agressividade inerente do próprio objeto. A vivacidade do quadro advém do jogo entre elementos contrastantes. As cores ora são pálidas, como o azul e bege claros mais ao centro do quadro, e ora fortes, no caso do vermelho das letras e tons de marrons escuro na bomba, e na parte superior e inferior do quadro. O contraste da delicadeza de rendas e bordados com símbolos que representam força e velocidade, formam um conjunto nem um pouco monótono.

Trabalho Descrição II

Exposição: Virada Russa

Local: Centro Cultural Banco do Brasil - São Paulo




Obra analisada: Pente Azul-Escuro, 1917. Óleo sobre tela, 133 x 146 cm. Museu Estatal da Rússia.

Artista: Wassily Kandinsky


Nessa obra abstrata a proposta é sentir o quadro através de suas formas e cores.

Há um predomínio de cores frias, principalmente os vários tons de azul, que criam um cenário de comedida serenidade. Essa não inabalável tranquilidade é sugerida por cores quentes espalhadas moderadamente pelo quadro. O vermelho que entra no quadro no canto superior à direita é rapidamente diluído e rodeado por outras cores. Existe também uma curva laranja bem definida que sustenta o quadro na parte inferior. Além de várias outras manifestações de cores quentes em forma de mancha e borrões. A presença dessas cores irradia uma certa instabilidade, a parte escura no canto superior esquerdo contribui para esse efeito. Ao final desse passeio dos olhos perante a obra que emite pulsões através de cores, brilhos, de linhas e outras formas ora ondulantes, ora ziguezagueantes nossa alma é tomada por uma certa ansiedade positiva e aprazível.



Trabalho Descrição I

Exposição: Luz Noturna
Local: Caixa Cultural São Paulo


Obra analisada: Náufrago, 1927. Xilogravura, 15,5 x 17 cm. Coleção Hermann Kummerly.

Artista: Oswaldo Goeldi


O Motivo principal dessa obra dramática tanto pode ser a morte, a solidão, ou o desamparo representado por um náufrago moribundo ao centro da cena. Sua figura cadavérica é representada por grossas linhas que delineam a cabeça, os braços, o corpo, e uma perna. Seu crânio, corpo e pé são preenchido por linhas estriadas que sugerem um esqueleto. Estirado ao longo do precário e pequeno barco no qual se encontra, homem e embarcação formam um único elemento principal sorumbático. Suas duas mãos mergulhadas na água e a boca aberta sugerem sede, e consequentemente sofrimento. Finas linhas delineam as formas de casas, prédios ou barracões ao fundo da imagem.



29 de setembro de 2009

Poe-minhas



Com um poema visual  começo

retomando o grandissí-ssi-mo Arnaldo Antunes

Agora vamos de Mario Quintana, de Velório sem Defunto. Ed. Globo.

Crenças

Seu Glicínio porteiro acredita que rato, depois de velho, vira morcego

-É uma crença que ele traz da sua infância

Não o desiludas com o teu vão saber,

Respeita-lhe os queridos enganos:

Nunca se deve tirar o brinquedo de uma criança

-Tenha ela oito ou oitenta anos!

Baudelaire

Baudelaire, fervoroso adepto e puxa-saco de satã,

Meu Deus! era demais até...

Mas Deus esperou pacientemente que ele morresse

E, para vingar-se dele de uma vez por todas,

O mandou para o Reino dos Céus!

Da imparcialidade

O homem - eternamente escravo de suas paixões pessoais -

É absolutamente incapaz de imparcialidade

Só Deus é imparcial

Só Ele é que pode, por exemplo,

Abençoar, ao mesmo tempo, 

As bandeiras de dois exércitos inimigos que vão entrar em luta...